Senta que lá vem história mágica e sombria, por Neil Gaiman e Al Sarrantonio

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Por Ana Paula Laux – Seres Mágicos & Histórias Sombrias é uma coletânea de contos organizada por Neil Gaiman e Al Sarrantonio, com tradução de Regiane Winarski e publicação da Darkside Books. Esse foi um livro que queria muito ler. Me interesso bastante pelo trabalho do Neil Gaiman, foi com ele que aprendi, pode-se assim dizer, a gostar de literatura fantástica, depois de ler o ótimo Lugar Nenhum.

Um ponto positivo de Seres Mágicos é a variedade de autores da seleção, alguns muito conhecidos dos leitores e outros nem tanto. Há alguns contos ótimos, outros medianos e outros meio arrastados, mas no balanço geral algumas histórias ganham vida própria na imaginação do leitor.

O livro tem vinte e sete contos dos seguintes autores: Neil Gaiman, Roddy Doyle, Joyce Carol Oates, Joanne Harris, Michael Marshall Smith, Joe R. Lansdale, Walter Mosley, Richard Adams, Jody Picoult, Michael Swanwick, Peter Straub, Lawrence Block, Jeffrey Ford, Chuck Palahniuk, Diana Wynne Jones, Stewart O’Nan, Gene Wolfe, Carolyn Parkhurst, Kat Howard, Jonathan Carroll, Jeffery Deaver, Tim Powers, Al Sarrantonio, Kurt Andersen, Michael Moorcock, Elizabeth Hand e Joe Hill.

Meu conto favorito foi “As estrelas estão caindo”, de um autor que não conhecia ainda, Joe R. Lansdale, um texano que é conhecido pela série de mistério Hap & Leonard. O conto é sobre um homem dado como morto na guerra, mas que volta para casa e encontra outra realidade para lidar, uma família (e uma existência) que não mais reconhece, além de carregar consigo as lembranças traumáticas da guerra. É poético, bem escrito e tem um ótimo final.

O conto de Neil Gaiman é também muito bom, tem um tom místico e muda de rumo na metade, ao passo que autor vai liberando informações novas. “A verdade é uma caverna nas Montanhas Negras” mostra um homem em busca de uma caverna dita mágica, e a viagem emocional que ele faz até chegar ao lugar ao lado de um guia. Uma frase que eu gostei muito dessa história foi:

“Às vezes eu acho que a verdade é um lugar. Na minha mente, é como uma cidade: pode haver cem estradas, mil caminhos, todos que acabam levando ao mesmo lugar. Não importa de onde você vem. Se você anda na direção da verdade, vai chegar a ela pelo caminho que escolher.”

 

 

Conheço Jeffery Deaver apenas pelo famoso O Colecionador de Ossos. Aqui ele escreveu “Terapeuta”, a história de um psicólogo que tenta salvar as pessoas de “espectros malignos”. O conto é bem conduzido, tem um grande momento de surpresa e um final razoável. É mistura de suspense e sobrenatural.

Lawrence Block escreveu “Pegar e soltar”, conto sobre um serial killer que gosta de “pescar” vítimas, ou seja, matar mulheres que “mordiam sua isca”. Gostei da história ao ponto de comentar no Twitter e o Block, bastante presente nas redes sociais, respondeu o tweet em português!

 

Outro bom conto é o de Joyce Carol Oates, autora que já tinha ouvido falar bastante mas nunca li nada até agora. Figuras Fósseis traça o paralelo entre a vida de gêmeos, dois homens fisicamente e emocionalmente diferentes, principalmente no que se refere ao caráter. A reflexão é sobre como eles conduziram suas vidas e o que realmente importa quando se chega no fim.

Walter Mosley é o romancista norte-americano que criou o detetive Easy Rawlins e que, em 2019, ganhou o prêmio de maior prestígio na literatura policial, o Edgar Award, pelo livro Down the River Unto the Sea, ainda inédito no Brasil. Esse prêmio foi importante porque são poucos os autores negros premiados pela literatura policial e de crime nos Estados Unidos. Ele, ao lado da Attica Locke, que ganhou o Prêmio Edgar em 2018, são duas referências atuais para além de Chester Himes por exemplo, morto em 1984.

O conto de Mosley se chama “Juvenal Nyx”, cujo protagonista é uma espécie de vampiro solitário que passa dias (ou noites) caçando vítimas e redescobrindo como se relacionar com o mundo, com o amor e consigo próprio. É também existencialista, melancólico, a história não tão atraente mas bem escrita ao ponto de prender a atenção na leitura.

O som mais alto do mundo é a ausência de uma criança. É assim que Jodi Picoult começa seu conto, Pesos e Medidas, que trata da morte de uma criança e de como os pais lidam com esse luto. É triste, doído e muito sensível.

Há histórias que, como citei no início, achei arrastadas. A de Joe Hill é uma delas, o último conto da coletânea e que inclusive nem aparece no sumário ilustrado. “O diabo na escada” é uma fábula sobre um homem que sucumbe à maldade nesse pequeno lugar na Itália onde nuvens se misturam às ruas e as escadas são como rumos que podem ser tomados na vida. Talvez por ser simbólica demais – a metáfora da metáfora da metáfora -, ou porque as expectativas com relação a Hill fossem altas, talvez tudo isso tenha tornado a leitura decepcionante.

“Histórias”, de Michael Moorcock, se perde desde o início. Não é um conto fantástico nem de suspense, mas um relato cansativo (11 páginas) sobre um suicida e os passos que deu na vida, amigos, trabalho. O autor é editor da revista New World e, como diz na biografia dele, ajudou a promover o movimento new wave na ficção científica.

Entre os outros 18 contos, tem o do Chuck Palahniuk que é louco e engraçado (um homem toma ácido e vai participar de um programa de prêmios na TV), tem Peter Straub com “Mallon, o guru”, que eu esperava mais mas é OK, tem o divertido “O diário de Samantha”, de Diana Wynne Jones, que peca apenas no final, e “O culto do nariz”, de Al Sarrantonio, mediano e bastante bizarro.

Seres Mágicos & Histórias Sombrias é uma porta de entrada para o trabalho de uma variedade de autores, bom principalmente para fãs de literatura fantástica. São 448 páginas, o livro vem com capa dura e a edição da Darkside Books ficou caprichada, com ilustrações do pintor e escultor texano Jason Limon. Como diz Neil Gaiman, a magia da ficção é pegar as palavras e utilizá-las para construir novos mundos. E aqui a gente encontra vários.

 

* Exemplar enviado pela Darkside Books.

 

SOBRE O LIVRO

Título: Seres Mágicos & Histórias Sombrias
Organizadores: Neil Gaiman e Al Sarrantonio
Tradução: Regiane Winarski
Páginas: 448
Editora: Darkside Books
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SINOPSE – As melhores histórias são poderosas o suficiente para fazer com que o leitor continue virando as páginas, ávido para obter respostas para a pergunta que move todos os curiosos: “o que aconteceu depois?”. É uma conexão que vai muito além das restrições de gênero literário; no fim, o que importa são as histórias, e se elas são capazes de desprender o leitor da realidade para fazê-lo simplesmente imaginar. É com essa certeza inspiradora que Seres Mágicos & Histórias Sombrias começa. Neil Gaiman, autor de Deuses Americanos, Coraline e Sandman, se uniu ao escritor de terror e ficção científica Al Sarrantonio para editar uma antologia especialmente sombria e mágica para leitores curiosos que gostam de sonhar. Eles sabem que os escritores são os criadores de um portal mágico capaz de sugar cada um de nós para seus universos particulares, e moldam mundos onde as palavras se tornam uma paleta de cores únicas capazes de ganhar vida em nossos corações, sonhos e pesadelos. Com 27 histórias que expandem e redefinem a ficção imaginativa, Seres Mágicos & Histórias Sombrias reúne Joyce Carol Oates, Joe R. Lansdale, Jodi Picoult, Peter Straub, Chuck Palahniuk, Jeffery Deaver, Joe Hill e outros inúmeros autores renomados que toparam o desafio de transcender todo e qualquer limite ao darem vida a seus personagens e histórias de maneira afiada e intensa, cada um à sua maneira. Em “O Diabo na Escada”, Joe Hill conta a história perturbadora de um homem e seu declínio ao mal. “A Verdade é uma Caverna nas Montanhas Negras”, de Neil Gaiman, é um conto gelado e folclórico com um desfecho inesperado. “Figuras Fósseis”, de Joyce Carol Oates, narra o implacável e poderoso elo entre irmãos gêmeos. “As Estrelas Estão Caindo”, de Joe R. Lansdale, reflete sobre as mudanças na vida de um soldado da Primeira Guerra Mundial que volta para casa depois de passar anos afastado de quem ama. Em “Perdedor”, Chuck Palahniuk apresenta a história do membro de uma fraternidade que participa de um programa de tv durante uma viagem de ácido. De Carolyn Parkhurst, “Indisposta” é narrado por uma mulher de idade que recorda a relação tóxica com sua irmã. Estes são apenas alguns exemplos dos tesouros escondidos nas páginas deste livro. Mas a experiência de ler Seres Mágicos & Histórias Sombrias vai muito além disso: o livro é um verdadeiro compêndio com contos para todos os gostos e autores queridos para conhecer e revisitar. Para tornar a edição da DarkSide® Books ainda mais especial, o artista norte-americano Jason Limon emprestou seu singular talento para conectar a delicadeza e magia das palavras do livro em uma imagem poderosa. O resultado é uma edição única no mundo, feita de fã para fã, com capa dura e detalhes extraordinários. Em seu texto de abertura, Neil Gaiman ainda escreve que a magia da ficção é pegar as palavras e utilizá-las para construir novos mundos. E se viajar aumenta nossos horizontes, os destinos de Seres Mágicos & Histórias Sombrias ― e o reino sem fronteiras da ficção imaginativa ― vão transformar sua visão de mundo.

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